Copa não paralisa disputa eleitoral no Brasil

DE SÃO PAULO

Baixe esta pesquisa

Mauro Paulino
Diretor Geral do Datafolha

Há um mito disseminado no meio político instituindo que durante a Copa do Mundo o eleitor se desconecta da campanha e que, portanto, daqui para frente mudanças no quadro eleitoral só acontecerão após o término do torneio. Estrategistas de campanha que se pautarem por essa crença podem se equivocar. Há muito o brasileiro deixou de pensar apenas em futebol durante as Copas e mudanças significativas ocorridas em eleições anteriores demonstram que muitos eleitores permanecem sensíveis aos movimentos dos candidatos e da política mesmo durante trajetórias vitoriosas da seleção brasileira.

Desde 1994, quando se realizou a segunda eleição direta para presidente após o regime militar, parte do processo eleitoral coincide com os preparativos e a realização da Copa do Mundo. Já naquele ano ocorreram fatos importantes que impactaram a disputa eleitoral, enquanto Bebeto e Romário despontavam como ídolos nos Estados Unidos. Uma semana antes da abertura do torneio Lula liderava com 22 pontos de vantagem sobre Fernando Henrique. Uma semana após o Brasil sagrar-se campeão a diferença já havia despencado para três pontos. Nesse meio tempo, em 1º de julho - três dias antes da partida contra os anfitriões pelas oitavas de final - o presidente Itamar Franco lançou o Plano Real. A conquista de um título mundial após 24 anos de espera não foi suficiente para desviar a atenção dos brasileiros sobre as importantes medidas econômicas e eleitorais tomadas durante a campanha do tetra.

Na eleição seguinte Fernando Henrique se reelegeu liderando a disputa do início ao fim. Em apenas um momento foi ameaçado por Lula, por coincidência durante a Copa da França quando a seleção mesclou a experiência de Dunga e Taffarel com jovens talentos como Roberto Carlos, Rivaldo e Ronaldo. Às vésperas da abertura do torneio o candidato do governo viu sua vantagem de 17 pontos sobre Lula cair para apenas três pontos, reflexo em grande parte da demora em reagir diante da seca nordestina e, em especial, pela percepção disseminada de que o presidente havia chamado de "vagabundos" os que se aposentam com menos de 50 anos. A sensibilidade social do governo foi colocada à prova pelos eleitores às vésperas da Copa e sua recuperação se deu enquanto o país discutia também a convulsão de Ronaldo e o show de Zidane na final contra a França. Logo após a derrota da seleção o presidente recuperou a vantagem e a manteve até a vitória em primeiro turno. Foi durante a Copa o único movimento importante nas intenções de voto de 1998.

Em 2002, enquanto a família Scolari seguia para a Coreia do Sul, Lula liderava a disputa eleitoral com uma vantagem de 26 pontos sobre José Serra e Garotinho, embolados na segunda posição. Graças a uma inserção comercial programada para o início de junho, já com a Copa em andamento, Ciro Gomes saiu dos 11% que obtinha na primeira semana de junho para 18% no início de julho, empatando com Serra enquanto Lula caía. Esse movimento ocorreu durante a fase final da conquista do penta estrelada por
Marcos, Roberto Carlos, Rivaldo e Ronaldo, recuperado das cirurgias no joelho. Em meio às comemorações, Ciro Gomes continuou subindo e encostou em Lula, graças também à associação de sua imagem à da esposa, Patrícia Pilar, estrela da novela e que, de cabeça raspada lutava contra o câncer. Mais adiante, já distante da Copa, Ciro declarou que o papel de Patrícia na campanha era "apenas de dormir com ele", além de destratar um ouvinte em entrevista de rádio. Ciro voltou a 11%, Lula recuperou-se e bateu Serra no segundo turno.

Na Copa de 2006 a seleção de Parreira chegou como favorita mas foi eliminada pela França em semifinal marcada pelo episódio da meia de Roberto Carlos. Lula manteve a liderança do início ao fim da campanha e venceu o segundo turno contra Alckmin. Assim como a Copa a eleição não empolgou os brasileiros e foi, entre as quatro, a única que não apresentou movimentos importantes nas intenções de voto, nem durante o torneio.

Neste ano, o último Datafolha mostra que 42% dos eleitores já revelam grande interesse pela Copa do Mundo, mas 32% também se interessam muito pelas eleições para presidente. Entre os apaixonados por futebol, mais da metade tem grande interesse pelas eleições. Não há motivo para se acreditar que todos os brasileiros desistirão da eleição para pensar só em futebol.